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O 'desafio da maternidade' versus a maternidade desafiadora

Momento Lifetime
Por Lifetime Brasil el 23 de July de 2022 a las 00:30 HS
O 'desafio da maternidade' versus a maternidade desafiadora-0

Você aí pelas redes sociais deve ter visto o seu feed de notícias ser tomado por posts do Desafio da Maternidade. Ideia de corrente simples, dessas que de tempos em tempos, invadem nossos Facebooks. O objetivo era postar 3 fotos mostrando "a felicidade de ser mãe". E, claro, como uma boa corrente, era preciso marcar mais um monte de mulheres que você considerasse "grandes mães".

 

Para a sociedade, no geral, uma mãe não tem outra opção a não ser ser feliz. Afinal, ela recebeu "o maior presente de todos", "uma dádiva", uma "bênção de Deus". Mães são grandes. Mães são exaltadas.

 

E não estou dizendo que não deveriam ser, mas...

 

Durante muitos séculos, a única função de uma mulher era ser esposa e mãe. Ela era criada para isso. Em tempos bíblicos (e até mais recentes e em algumas culturas modernas), uma mulher podia ser devolvida à sua família se não gerasse herdeiros. Nações foram modificadas, religiões foram criadas, pactos políticos foram abalados por mulheres que não cumpriam o seu único propósito de vida. Que o diga as seis rainhas-consortes de Henrique VIII.

 

Para muita gente, até hoje, uma mulher não é completa sem a maternidade. Mas já não basta ser apenas mãe, tem que AMAR ser mãe. A sociedade cobra isso também, pesado. Afinal, o que são noites mal dormidas diante da possibilidade divinal de se gerar uma nova vida?

 

Embora o termo "dar à luz" tenha sido cunhado para designar o momento em que o bebê é retirado da escuridão do útero, para muitos é associado a todo o suposto brilho dessa fase da vida da mulher.

 

Como tudo o que ainda não experimentamos e é novo na vida, deveríamos ter o direito de gostar ou não. Uma moça chamada Juliana Reis foi rechaçada nas redes sociais por declarar que não está gostando de ser mãe (confira o post ao final do texto). Ela ama o seu filho (que, diga-se de passagem, está bem cuidado, obrigado), mas odeia a maternidade. O lado real da coisa toda. Como vocês podem culpá-la por estar cansada da rotina nova desgastante? Por estar cansada de ouvir palpiteiros dando opinião e inventando regra sobre tudo? Por estar exausta de um mundo de fraldas sujas, Galinha Pintadinha, de choros indecifráveis? Por estar cansada a ponto de nem animar a pentear o cabelo? Mas não, vocês EXIGEM que a sublimação de ter os filhos nos braços seja maior que a dor física que ela declarou sentir ao amamentar.

 

Juliana está sendo culpada de dizer que a maternidade real não tem glamour. O que ela fez foi simplesmente se recusar a ser mais um veículo de propaganda de que maternidade é tão e somente algo maravilhoso. O que esta mulher, muito corajosamente fez, foi se recusar a ser parte de um discurso opressor para muitas mulheres. E antes que você diga "ih, lá vem a feminista com esse mimimi de opressão", pense: qual foi a última vez que você viu uma corrente semelhante envolvendo homens e paternidade?

 

Acho que nesses tempos midiáticos que vivemos, essa cobrança sobre nós mulheres fica ainda mais intensa. Quando vejo fotos mega produzidas, com fundo desfocado e tudo, de partos humanizados em casa, em banheiras com pétalas de rosa, tudo muito lindo, penso que aquilo faz mais mal do que bem para a auto-estima coletiva das mulheres. Afinal, nem todas têm acesso a algo tão lindo, que parece de revista. Muitas vezes dão à luz em salas de cirurgia insípidas. Quando vejo uma atriz com a barriga chapada 15 dias depois de parir e a manchete de que ela já perdeu os 19 quilos adquiridos na gestação, fico pensando em como isso afeta aquela mãe que, quatro anos depois, ainda luta com barriga saliente que insiste em não sair. A maternidade ainda é muito romantizada.

 

Só que a maternidade é desafiadora. Ok, isso não parece novidade. Mas a sociedade ainda espera que nós mulheres passemos por isso e entendamos na marra que existe uma recompensa. Mesmo que essa recompensa seja a cara do pai, como muitos vão sempre fazer questão de te lembrar!

 

Ser mãe é anular boa parte de quem você era antes disso. Mas somos julgadas se lamentamos isso, porque historicamente já éramos nulas. Agora, no século 21, já somos nós mesmas e nem todas estão preparadas para se anular. E isso é normal! É natural sentir um certo luto por algo que ficou pra trás, a sua individualidade. E tudo fica ainda mais pesado quando temos que sorrir, mesmo com vontade de chorar, porque é isso que devemos fazer para provar ao mundo que, enfim, cumprimos o nosso papel.

Desafio NÃO aceito! Me recuso a ser mais uma ferrramenta pra iludir outras mulheres de que a maternidade é um mar de...

Publicado por Juliana Reis em Segunda, 15 de fevereiro de 2016

 

 


 

Carol MaglioCarol Maglio é a blogueira conhecida como Pãozim De Queijo, além de produtora audiovisual, apresentadora de TV, modelo plus size e especialista em mídias sociais.
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Foto: Reprodução / Facebook